Raça X Nacionalidade (78)
Argentina

Raça X Nacionalidade (78)


Após uma série de negociações para criar um convênio de cooperação na área de segurança dos estádios durante a Copa do Mundo, no dia 18 de março de 2014, na sede da embaixada Argentina em Brasília, ambos os países celebraram um acordo bilateral de cooperação, onde a Argentina se comprometia fornecer ao Brasil todas as informações solicitadas nas áreas de segurança e migração. O acordo previa o reforço na segurança nas fronteiras, principalmente quanto à entrada de torcedores argentinos no Brasil na Copa.

A principal justificativa se deu por conta de que em 2006, os chamados ?barras bravas?- torcida organizada do país vizinho conhecida por histórico de violência - enfrentaram hooligans ingleses na República Checa para fugir do território alemão e sanções mais duras. Já na África do Sul, 29 dos 300 ?barras? foram deportados por problemas judiciais.

O Brasil solicitou claramente à Argentina uma lista com torcedores que possuíssem pendências judiciais em seu país, além daqueles que tiveram a entrada proibida nos estádios argentinos.

Firmado o acordo, posteriormente, na data de 16 de abril de 2014, a justiça argentina decidiu que o governo brasileiro e a Interpol não poderiam ter acesso aos antecedentes criminais de integrantes de torcidas organizadas argentinas, ressaltando que a decisão ainda poderia ser revista.

Como não poderia deixar de ser, a advogada Debora Hambo, representante das 38 ?hinchadas? argentinas (aproximadamente 650 integrantes do grupo Hinchadas Unidas Argentinas ? HUA ? e outros cerca 1500 Barras Bravas), resguardando as garantias individuais de seus conterrâneos e acima de tudo, respaldada pela soberania de seu país e por princípios básicos de Direito Internacional, manifestou-se formalmente a respeito do acordo, requisitando que as autoridades internacionais e o governo brasileiro só poderiam ter acesso às informações caso os torcedores permitissem. "São pessoas com histórico de violência, sim, que têm ficha-suja, mas que têm direito de ir para o Brasil", afirmou Débora à época. Disse ainda a procuradora que buscava evitar a perseguição que os torcedores sofreram na África do Sul em 2010.

A juíza Cecilia Negre deferiu o pedido no Juizado Federal 8, sentenciando da seguinte maneira: "O Estado Nacional - Ministério da Justiça e Direitos Humanos - deverá abster-se a fornecer dados pessoais e que constam nos diferentes registros nacionais, a República Federativa do Brasil e/ou Interpol Brasil, no âmbito do Acordo de colaboração assinado entre os dois países por ocasião da Copa do Mundo FIFA 2014".

Após a decisão, o governo argentino protocolou recurso à sentença, obtendo êxito: no último dia 22, a juíza Cecilia Gilardi Madariaga aceitou a apelação do governo e anulou a decisão anterior, bem como indeferiu o recurso de um torcedor que queria impedir que seus dados pessoais fossem revelados às autoridades brasileiras.

Débora Hambo deixou claro que o caso está longe de ser encerrado no que o Direito lhe permita: "é o segundo round, como se fosse uma luta de boxe. Vamos recorrer". Afirmou ainda que seus clientes estão sendo vítima de perseguição política, ainda que tenha admitido que os mesmos já estiveram envolvidos em processos penais e violência nos estádios.

onde os "Barras" ficarão alojados
Todavia, mesmo com a sentença desfavorável, os torcedores já possuem local reservado para alojamento no Brasil: tanto os ?barras' quanto os turistas, terão à disposição um acampamento na cidade de Canoas, localizada na grande Porto Alegre. O Parque Eduardo Gomes servirá como base para torcedores sul-americanos.

Um questionamento que não deve passar despercebido é que o governo brasileiro argumentou que com uma distância maior com o país-sede (somado ao apoio de políticos e até de pessoas ligadas ao governo de Christina Kirchner, situação questionada em jornais argentinos) em 2010, esses torcedores causaram muitos problemas, presumindo dessa forma que a proximidade com o Brasil causaria danos maiores.

Entretanto, é de conhecimento geral de que o Estado Brasileiro se fez representar inclusive em reuniões a respeito de segurança na próxima Copa do Mundo de 2018, na Rússia (!!!), participou de assembléias referentes à violência mundial, bem como discutiu medidas internas na tentativa de coibir a enorme violência presente também em seu próprio território nos mais diversos casos fáticos e decorrentes.

É mais um assunto sério de âmbito internacional e político que merece e deve ser analisado com muita cautela. Partindo dessa premissa, e sem um posicionamento formal da Presidência da República (que tem pleno conhecimento que as exigências formuladas ultrapassam o seu direito e ferem de forma acintosa a soberania do país vizinho), no mínimo há que se questionar: outras nacionalidades também não mereceriam a mesma preocupação com a segurança do país e do evento, tendo em vista que medidas incisivas como esta não foram tomadas em relação a demais países (o que dizer dos famosos "Hooligans", da Inglaterra, e de torcedores da Rússia ou países do Leste Europeu, que já estiveram envolvidos em brigas gigantescas até mesmo em torneios de tênis na Austrália?)? Poderá, de certa forma, Débora Hambo ter razão quando vale-se do termo ?perseguição?, conforme sabemos que diversos países sofrem com torcedores violentos historicamente? Houve a mesma exigência proporcional ? ainda que tenha havido consenso e bilateralidade com a Argentina ?  com outros países?

*nota do blog: em 2009, o Brasil foi apontado como líder mundial em número de mortes em confrontos no futebol, à frente de Itália (2º) e Argentina (3º), com 42 mortes nos dez anos anteriores.  A liderança só faria aumentar: em 2013, foram 30 mortes, totalizando 234 nos ultimos 25 anos.



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