Off-Topic (18)
Argentina

Off-Topic (18)


*Postagem número 500 da história do blog.

"Cântico ofensivo". "Música agressiva". Muitas foram as maneiras que torcedores e imprensa brasileiros descreveram o "grito de guerra" entoado pela torcida argentina durante a Copa do Mundo.

Segue a letra:
Brasil, décime que se siente / tener en casa tu papá! 
Te juro, aunque pasen los años
Nunca nos vamos olvidar!
Que el Diego te gambeteó / y el Cani lo vacunó
Están llorando desde Italia hasta hoy!
A Messi lo van a ver
La Copa nos va a traer
Maradona és mas grande que Pelé!
Traduzindo livremente os versos, temos o seguinte: "Como vocês se sentem, brasileiros, recebendo na sua casa o seu chefe? Nós juramos: passe o tempo que for, nunca esqueceremos que Maradona os driblou e Caniggia fez o gol... não pararam de chorar desde então! Vocês irão ver o Messi levantando a Copa do Mundo, e Maradona é maior que Pelé".

Qual parte (ou seria toda a canção?) é realmente ofensiva, ataca a moral e a história do Brasil e seu povo?

"Chorando desde Itália até hoje"

Um trecho que demonstra um erro de interpretação é o "desde Itália...". Muitos comentários na internet, à época, davam a entender que seria uma referência à derrota da Seleção brasileira na Copa de 1982, para os italianos, episódio conhecido como "Tragédia de Sarriá" e eternizado na imagem da capa do Jornal da Tarde.
José Carlos Villela Jr., então com 10 anos de idade, foi
símbolo da tristeza que assolou o país naquela data.
Não, a canção não fala sobre aquele jogo: fala das oitavas-de-final da Copa de 1990, que aconteceu em território italiano, quando a seleção da Argentina eliminou o time do Brasil após vencer a partida por 1 a 0, gol marcado por Caniggia (el Cani) concluindo jogada individual de Maradona (Diego).

"Estão chorando até hoje". Sim: imprensa e torcida ainda falam da partida sem nenhum apuro dos lances e análise das qualidades individuais: fala-se tão somente da "água batizada". Fala-se que a vitória foi imerecida. Fala-se que todos os atletas foram "dopados". Fala-se que foi um roubo. Enfim...

Muito diferente das palavras do próprio jogador envolvido na situação, o lateral esquerdo Branco: "Já falei sobre isso... tomei a água e me senti muito tonto. Mas sempre reconheci, também, que a Argentina não nos eliminou por isso, e sim pela jogada genial de Maradona".

Na verdade, a seleção brasileira foi até mesmo beneficiada pela arbitragem: em chance clara de gol de Caniggia, um impedimento absolutamente inexistente foi marcado eno primeiro tempo, e a compilação abaixo mostra a total passividade do árbitro no que tange às faltas e cartões - o próprio Branco deveria ter sido expulso, após falta violenta acontecida nos acréscimos:



"Maradona é maior que Pelé"

A segunda estrofe da canção também foi muito criticada por brasileiros: "eles vêm aqui e dizem que Maradona é maior que Pelé! Como ousam?!".

Esse assunto já foi muito, muito debatido por aqui: 1) brasileiros acham inadmissível o comparativo com outro jogador -- Pelé seria um atleta absolutamente superior, muito melhor que tudo e todos -- e 2) conta-se que só e unicamente "os argentinos" acham Maradona tão bom assim.

Não vem ao caso rebater tais afirmações. Porém, vale lembrar que a resposta da torcida brasileira à canção argentina foi uma paródia de uma melodia polonesa, e conta com a seguinte letra: "Mil gols, mil gols, mil gols, mil gols... Só Pelé, só Pelé, Maradona cheirador!".

Uma comovente criatividade, e tom semelhante, certo?

Mas o estranho, mesmo, foi ver a torcida brasileira citando e exaltando Pelé. Nem na música popular, muito menos nos cânticos de estádios, o nome do rei do futebol é usado. Já Maradona, é presença constante tanto no cancioneiro argentino quanto nas músicas das "hinchadas".

De repente, a mesma nação que sempre menosprezou (e continua a fazê-lo) aquele que é seu maior ícone no esporte, o usa como escudo para enfrentar as "ofensas" argentinas.Sobre esse assunto, vale ler a excelente crônica de Bob Fernandes: "Brasil despreza e não merece Pelé".



Uma segunda canção criada por torcedores brazucas durante o torneio falava de Pelé. Um trecho: "Se você é argentino, então vai tomar no cu!".

"A musiquinha deles"

"Eles já se foram há algum tempo. Levaram para casa seus cânticos provocativos." É assim que a reportagem do 'Bom dia, Brasil' (exibida em agosto) se referiu aos torcedores argentinos e à canção 'Décime que se siente'.

Entretanto, não se tratava de uma matéria feita para lembrar a maneira que os hermanos torceram por sua seleção durante a Copa do Mundo: a produção mostrou as mais variadas paródias feitas por torcidas organizadas dos times brasileiros.

Após serem reproduzidas as versões de corinthianos, flamenguistas, gremistas e muitos outros, a apresentadora do telejornal conclui: "finalmente aquela musiquinha irritante foi melhorada aqui pelas nossas torcidas".

Melhorada?!

Depois da exibição do programa global, outras torcidas criaram suas versões. A do São Paulo Futebol Clube, por exemplo, menciona uma suposta homossexualidade de atletas que joga(ra)m pelo Corinthians.

O jornal argentino Olé também falou da nova febre nacional, com a seguinte manchete: "Agora eles gostam". O diário grafou: "o hit argentino segue tocando, mas o que mais surpreende é que está sendo cantado pelos próprios brasileiros"

No fundo, talvez a canção argentina tenha incomodado tanto o povo brasileiro porque, diferentemente do que acontece por lá, aqui não existe a cultura de se torcer pela seleção.




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