Isso é Jornalismo! (16)
Argentina

Isso é Jornalismo! (16)



Essa semana, a Argentina disputou um amistoso contra a Alemanha, em Munique, e venceu por 1 a 0. Quando já vencia a partida, ocorre um lance na defesa da selección: o zagueiro argentino Demichelis e o meia alemão Ballack sobem juntos no cruzamento.

O defensor desvia a bola e, em seguida, cai no chão, ficando deitado. O alemão Ballack reclama com o juiz de forma veemente. Narrador e comentarista do canal a cabo SporTV - pertecente ao grupo GloboSat - dão razão ao alemão: "realmente foi o Demichelis quem desviou", disseram.

O argentino permanecia no chão, e os jornalistas puseram em xeque a veracidade de seus atos: "a famosa catimba argentina", "é pra ganhar tempo", etc.

Em seguida, uma outra câmera mostra que, de fato, houve um grave choque entre Ballack e Demichelis, e dá um close no rosto do argentino, bastante inchado. O zagueiro foi retirado de campo, e exames posteriores confirmaram que ele sofreu três fraturas.

Feita essa introdução, vamos à razão: no mesmo dia da partida, navegando na internet como quem não quer nada, me deparei com este ótimo blog, cuja autoria é de Marcus Vinícius Motta: o título, bastante sugestivo, é "Contra a Correnteza".

Qual não foi minha surpresa, quando passei a procurar materiais antigos lá publicados, encontrei esse ótimo texto, intitulado "Argentina, Brasil". Uma verdadeira aula de história, de futebol, e de respeito.

Dou grande destaque para a frase onde o autor diz que "idiotas na mídia e nas narrações (...) transformam 'catimba' futebolística em quase uma deficiência moral de um povo". É, talvez, a melhor definição sobre o assunto dada até agora.

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Lembro muito bem a Copa de 1986, no México.

Assisti a mais um vexame do Brasil, consegui mais uma frustração na minha galeria de frustrações como amante do futebol (se bem de que 82 foi pior, muito pior) e tive que engolir o Maradona destruindo tudo em campo e dando o título para a Argentina.

Quatro anos mais tarde assisti o mesmo Maradona comandar a Argentina e implodir aquela seleção brasileira vagabunda do Lazaroni, tornando definitivamente o time hermano meu inimigo público futbolístico número 1.

No final das contas Argentina terminou vice-campeã e recordo que torci para que a Alemanha nos vingasse e metesse uma surra nos hermanos.

Só que depois da derrota deles ser consumada e de assistir a uma triunfal chegada da seleção argentina em Buenos Aires logo após a decisão, confesso que senti uma empatia enorme por eles a ponto de comprar uma camisa da seleção alvi-celeste pra mim.

Foi nesse ponto que começou a inflexão positiva porteña para mim.

Argentinos são sofridos, não porque o sejam naturalmente, mas porque gostam da coisa sofrida, suada, carregada de significado. Eles são mais frios que os brasileiros, porém tão quilomberos quanto, só que cada um ao seu modo.

Eles, protestam, quebram tudo, fazem o diabo pelos seus direitos. Nosso quilombo é outro. O brasileiro festeja.

Festeja sua pobreza, seus problemas, suas deficiências, passa a vida de uma festa a outra, meio que "esquecendo" a maioria das coisas que lhe aflige.

Somos tão próximos e tão diferentes e temos a nos separar ainda mais, nessa fronteira imaginária bem mais distante do que a real, este rio caudaloso e violento que é o futebol.

Só que por incrível que pareça, para eles a questão parece bem menos incomoda do que para nós, insuflados por idiotas na mídia e nas narrações de TV que transformam "catimba" futebolística em quase uma deficiência moral de um povo.

Passei férias em Cabo Frio e Búzios quase a minha adolescência inteira e a maior recordação que tenho é de argentinos sendo destratados. "Sujos", "abusados", isso e aquilo.

Daí, qual não foi minha surpresa ao chegar pela primeira vez em Buenos Aires e saber que eles simplesmente adoram brasileiros.Sério, não é figura de linguagem e nem exagero estilístico, eles nos adoram!

Óbvio que tem as brincadeiras sobre futebol, mas a forma com que eles me tratavam lá me causava vergonha pela forma com que eles são tratados aqui, na maioria das vezes.

Por isso mesmo eu acho que os brasileiros deveriam ouvir menos o Galvão Bueno e concentrar-se mais nas qualidades e belezas que nossos hermanos tem para oferecer, porque acreditem, são muitas.




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